- 28 de fevereiro de 2020
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- Category: Diálogos
Aluno(a): Professor, tenho uma dúvida sobre ação rescisória.
Prof.Arthur: Pois não, pode falar.
Aluno(a): No rol de hipóteses de cabimento de ação rescisória, o CPC atual fala em “violar manifestamente norma jurídica”, enquanto o código anterior (CPC/73) falava em “violar literal disposição de lei”. Qual a diferença?
Prof.Arthur: O CPC de 2015 veio resolver um equívoco de redação do código anterior, afinal, o que se aplica, no caso concreto, não é a lei em si, mas sim a interpretação que se extrai do texto da lei.⠀
Aluno(a): Não entendi, professor.⠀
Prof.Arthur: Deixa eu explicar. Quando você lê determinado artigo de determinada lei, você consegue lê-lo de forma isolada sem levar em consideração mais nada?⠀
Aluno(a): Acho que consigo…⠀ ⠀
Prof.Arthur: É mesmo? Imaginemos que uma parte desse artigo viole a Constituição Federal, ainda assim você utilizaria a “lei seca” para o caso completo?⠀
Aluno(a): Hmmmm…
Prof.Arthur: Vou ser mais específico: se desse texto, a gente pudesse somente trocar o significado de uma palavrinha e isso fosse suficiente para deixar a norma de acordo com a Constituição? Ou seja, bastaria ter uma nova interpretação para que um texto deixasse de ser inconstitucional e passasse a ser constitucional… o que você faria?⠀
Aluno(a): Ah, não, nesse caso eu interpretaria de acordo com a Constituição.⠀ ⠀
Prof.Arthur: Pois é. Você acabou de me dizer então que não é a “lei” que é aplicado caso concreto, mas que é a interpretação.⠀
Aluno(a): E foi?⠀ ⠀
Prof.Arthur: Lógico, você acabou de dizer que o texto permaneceria igual, mas que seria interpretado de uma forma diferente e que isso traria uma norma constitucional.⠀
Aluno(a): Ah, tá… é verdade, professor.⠀
Prof.Arthur: Então, no caso, o resultado da sua interpretação é a norma!⠀
Aluno(a): Tá, mas e o significaria “violação manifesta”? O juiz deveria dizer “eu não APLICO essa ou aquela norma ao caso porque ela é ruim”?
Prof.Arthur: Bom aí temos um problema quanto a terminologia do inciso VI do art. 966 do CPC de 2015, pois segundo Ronaldo Cramer no livro Comentários ao novo Código de Processo Civil, “Violar a norma não é apenas negar vigência a uma norma existente, por não se concordar com o seu preceito. É mais que isso. A violação compreende toda forma de ofensa à norma jurídica, ou seja: não aplicar a norma, quando ela deveria ser aplicada; aplicar a norma, quando ela não deveria ser aplicada; e aplicar a norma, quando ela deveria ser aplicada, mas, por meio de interpretação equivocada, se alterou o seu sentido.”⠀
Aluno(a): Faz sentido, professor.⠀ ⠀
Prof.Arthur: E eu até que concordo com o que falou o Ronaldo Cramer, mas…⠀
Aluno(a): Ah, professor, sempre tem um “mas”.⠀
Prof.Arthur: Mas o STJ, no julgado REsp 1749812/PR, decidiu de maneira diferente e entendeu que “é indispensável que a questão aduzida na ação rescisória tenha sido objeto de deliberação na ação rescindenda”. Assim, restringiu o cabimento da ação rescisória. ⠀
Aluno(a): Então, somente cabe ação rescisória se o juiz tratar sobre o assunto.⠀ ⠀
Prof.Arthur: Exatamente. O julgado somente poderá ser rescindido se o juiz tratar sobre o assunto. Se ele simplesmente omitir sobre a aplicação de determinada norma, não caberia ação rescisória, segundo a atual visão do STJ.